sexta-feira, 20 de agosto de 2010

Sous Vide - Fundamentos

"R, preciso de um favor.....". O amigo/chef Manuel Coelho seria tema de uma matéria para a revista Gula, e precisava de um termocirculador. Queria o meu emprestado. E lá foi ela - a máquina - posar, tal qual playmate, para a Gula; centerfold (bem, nem tanto, mas pelo menos é página 85 inteira...) na edição 210, Agosto/2010 da revista. Me senti meio que Eike Batista........
Como muita gente tem me perguntado o que é o tal do Sous Vide, resolvi fazer um post a respeito. Até explico em linhas (bem) gerais em minha página "Como", mas vale uma explicação mais detalhada. A reportagem do Manuel está ótima e esclarece bem o tema, mas queria dar o caminho das pedras pra quem tem a intenção de fazê-lo em casa. Nem que seja, como eu fazia no início, "Sans Vide".............




O conceito geral do Sous Vide é relativamente simples de entender: coloca-se o alimento num saco plástico apropriado, sela-se a embalagem a vácuo, e cozinha-se a temperatura controlada por imersão num banho de água circulante (por isso se chama termocirculador) por um determinado tempo, que dependendo do alimento pode ser de minutos a dias.

Para fazê-lo com maestria, entretanto, é necessário equipamento e técnica. Assim, vou contar como foi minha evolução nesse método de cocção...

Minhas primeiras experiências foram "Sans Vide", pois não tinha equipamento adequado. Assim, embalava o queria cozinhar em múltiplas camadas de papel celofane, e levava ao meu forninho Cuisinart com controle de temperatura. Fiz assim muitos confits de canard excepcionais: lambuzava os danados com azeite, um pouco de sal grosso, alecrim, tomilho e pimenta do reino; embrulhava em várias voltas de celofane e levava ao forno a 80C por umas 10 horas. E me perguntava: por que o vácuo, e por que o tal termocirculador?

Na sequência, comprei uma máquina de vácuo da FoodSaver, que facilitou o processo e o resultado final.  Foi aí que o Manuel me convenceu a comprar um termocirculador. Comprei, me empolguei, e passei a estudar o assunto. Há uma quantidade razoável de fontes sobre o tema, mas minhas referências principais são duas: se você quer pagar e ver fotos fantásticas num livro impecável, compre Under Pressure, do Thomas Keller. Agora, se você quer entender a técnica de graça, simplesmente faça o download do melhor manual sobre o assunto: A Practical Guide to Sous Vide Cooking, de Douglas Baldwin. Nesse documento, que também está disponível em português no site do GastronomyLab, ele discute aspectos técnicos do método, inclusive esclarecendo dúvidas para as quais ainda eu não tinha resposta: o termocirculador é melhor que o forno porque a água tem uma condutividade térmica 23 vezes melhor que o ar, permitindo um cozimento mais homogêneo; e o vácuo srve para garantir que a água esteja em contato com todo o alimento, sem bolsões de ar, o que comprometeria justamente essa mesma condutividade (além de outras vantagens). Aliás, o Douglas já publicou seu livro sobre o método, Sous Vide For The Home Cook, disponível via third parties na Amazon.

Enfim, vamos dar uma olhada no método passo a passo:


Prepare o alimento que deseja cozinhar Sous Vide. Nesse caso, um lagarto que será cozido a 55C por 24 horas, ficará ao ponto, rosado, e macio como filé mignon.









Coloque na embalagem plástica, retirando o ar com o equipamento adequado.










Programe o termocirculador, e coloque o alimento na água pelo tempo e temperatura adequados
















Depois de pronto, é muito importane pasteurizar, se não for consumir imediatamente; dê um choque térmico, que pode variar de minutos a horas, dependendo do alimento. O Douglas Baldwin dá as tabelas de tempo detalhadas.






 
No caso de carnes, o sous vide fica devendo o tom dourado da caramelização externa, fruto da reação de Maillard. Resolvemos isso de três maneiras: sapecando a carne com um maçarico de butano, que dá uma chama fortíssima de 1200C; colocando no forno a lenha quando estiver bombando (o que dá um trabalho considerável, a não ser que você resolva aproveitar para dar acabamento num rosbife que vai guardar pronto antes de de fazer uma pizza, por exemplo); ou, como fizemos aqui, dourando numa frigideira muito, muito quente com um filme de óleo de canola. Note como, diferente de um rosbife feito no forno, que é bem passado externamente e rosado no miolo, o nosso fica rosado por inteiro, apenas com a camada externa dourada - e, com já disse, macio como filé mignon.



Pronto, tarefa cumprida. Se for brincar com isso, não deixe de ler os materiais indicados; Sous Vide não é uma técnica delicada, mal executado pode levar a riscos de saúde, pela facilidade de reprodução de microorganismos em determinadas faixas de temperatura. Mas feito corretamente, gera resultados surpreendentes.







5 comentários:

  1. Caro RL, obrigada por compartilhar, tão claramente, os seus experimentos.
    Gostaria de uma opinião sua.
    Fuçando encontrei varias receitas de lombo e pernil à la sous vide, a maioria sugere o cozimento com o alimento cru na marinada, porém encontrei algumas que indicam, no caso do lombo, selar na frigideira, até um dourado satisfatório e depois colocar para o cozimento. Esse procedimento não colocaria em risco a assimilação do tempero durante o cozimento? O custo benefício vale?
    O que vc acha?
    Douro antes ou depois?
    Obrigada,
    Sandra
    Ah, adorei seu blog, parabéns.

    ResponderExcluir
  2. Sandra, obrigado pelos elogios!
    Você não ganha nada ¨selando¨ qualquer proteína antes de embalar para o sous vide. Pelo contrário, os (discutíveis) benefícios nao compensam. Eu testei? Não. Estou repetindo o que dizem os autores que confio, e faz sentido. Aliás, vou fazer um post a respeito. Por enquanto, sugiro que tempere a proteína (no caso, o lombo) a seco ou úmido, embale, cozinhe sous vide, e somente doure numa frigideira bem quente com óleo de alto ponto de degeneração (amendoim, canola, semente de uva, etc) na finalização. Se quiser maximizar o resultado, fica a dica: não coloque ácido no tempero, e acrescente 1 colher de chá de bicarbonato de sódio para cada 2 colheres de sopa de sal que usar para temperar; isso vai tornar a superfície da carne alcalina, o que facilita absurdamente a caramelização, deixando a carne bem dourada rápido. Depois - no caso do lombo, por exemplo - acrescente o ácido em forma de um vinagrete a quente ou a frio. Enfim, teremos post a respeito em breve. RL

    ResponderExcluir
  3. RL,

    Estou experimentando com o sous vide e tenho uma dúvida. Que tipo de sacos plásticos você usa e onde você os compra?

    Grato,

    MM

    ResponderExcluir
  4. MM, depende de que equpamento você usa para embalar o alimento. Em aparelhos com câmara, são sacos próprios, mais grossos, padrão industrial (o que não deve ser seu caso). Se tiver ou for comprar um aparelho por sucção como o meu (FoodSaver, Lava, Caso, etc) precisa usar as embalagens próprias, que vêm em rolos. Aqui é difícil de achar e custam bem caro (já encontrei no MErcado Livre); eu sempre compro quando viajo. Agora, para quebrar o galho e começar a brincar, dá pra usar sacos Zip; mergulhe o saco com o alimento com uma pequena parte do Zip aberta, deixe a pressão da água retirar o ar, e termine de fechar a embalagem. Vou fazer um post a respeito.

    ResponderExcluir